sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

O disco de uma geração.


Com “Sgt. Peppers”, os Beatles promoveram uma renovação espantosa no cenário artístico da época.

Atualmente, a segmentação do campo musical em uma ampla série de gêneros musicais dificulta, cada vez mais, a percepção de ídolos capazes de representar uma ampla parcela do público ouvinte. Contudo, há poucas décadas atrás, parecia ser mais fácil discutir e apontar o surgimento de clássicos que marcariam toda uma geração. Na década de 1960, entre todo o material gravado na época, o álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band” dos Beatles parece ocupar um lugar especial.

Nesse período, a cultura ocidental experimentava uma série de mudanças em grande parte reverenciada por uma parcela de jovens insatisfeitos com o status quo. A liberdade sexual, as provocações inteligentes dos escritores da “beat generation”, o movimento hippie, a pop art e o pacifismo contrário à Guerra do Vietnã se tornavam elementos férteis nas mentes e corações de muitos indivíduos dessa época. Não por acaso, o consagrado álbum dos Beatles tenta dialogar com todas essas tendências.
Sob o aspecto musical, esse álbum pretendia romper barreiras quando teve a ousadia de extrapolar a já consagrada instrumentação que definia o rock’n’roll. Ao invés de se manter na mesma fórmula que popularizou o som da banda, os Beatles se aproximaram aos elementos da música erudita e flertaram com a iniciante música eletrônica. A entrada nesse novo caminho de possibilidades colocava o “Sgt. Peppers” em sintonia com o experimentalismo das drogas e da psicodelia da época.
Além disso, as letras traziam uma possibilidade diferente das narrativas lineares que poderiam atingir facilmente a qualquer ouvinte. Nesse álbum, as mensagens têm um grande poder de comunicação, contudo, requerem um exercício de reflexão um pouco mais elaborado. O próprio nome do disco, que faz referência ao nome de uma banda, buscava criar uma situação ficcional em que os famosos rapazes de Liverpool seriam algo diferente daquilo que todos estavam acostumados a ver e escutar.
Outro ponto que demonstrava a quebra de paradigmas proposta pela banda, foi a criação de uma capa onde o conjunto aparece mesclado a uma série de elementos e personagens famosos naquele período. A pretensão de menor importância era divulgar a imagem do grupo. Inspirados pelos conceitos da pop art e do movimento hippie, a capa é repleta de flores e conta com uma montagem onde aparece a imagem de atores de cinema, guias espirituais do Oriente, psicólogos, lideranças políticas, escritores e músicos.
Sem dúvida, esse álbum não tem a disposição de resumir toda a gama de canções e experiências musicais e grupos dessa época. No entanto, sua capacidade de síntese e experimentação trouxe uma centelha de renovação contrária a um mundo marcado pelos horrores da guerra do Vietnã e outros formalismos que não mais encontravam força entre a nova geração daquela época. “Sgt. Peppers” não veio para mudar o mundo, mas para demonstrar de que forma o mundo parecia estar mudando.
De lá para cá, muita coisa mudou e as questões que preocupam o mundo e a sua juventude também se modificaram. Difícil dizer se a arte, especialmente a música, ainda nos oferecerá uma obra de impacto semelhante. Contudo, toda a energia criativa responsável por um dos mais reconhecidos discos do século XX ainda é reverenciada como exemplo para muitos que buscam abraçar novas realidades por meio da música.

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